Há quem diga que o homem hoje é mais primitivo do que na época das cavernas. Lévi-Strauss, etnólogo francês, já nos havia advertido de tal fato, criticando firme, mas discretamente, o homem ocidental moderno. Antigamente, o homem fazia o fogo. Mas hoje, ao queimar uma lâmpada, ou acabar a força, nos colocamos em situação de perigo, desespero, raiva. Nos sentimos ilhados, sem o que fazer, sem como fazer.
O insuportável calor de Ribeirão Preto, que já começou a dar dicas de como será o verão, já indicava a possibilidade de um temporal. Este, que chegou repentinamente, escureceu os céus de um domingo que parecia normal. Domingo, quando o maior shopping center da cidade se enche de pessoas que não tiveram tempo de comprar durante a semana, de grupos de amigos que se renderiam às gorduras trans de um Big Mac, ou casais de namorados que curtem um cineminha no final do dia, para começar a semana com o pé direito. Mas então, o céu desabou, e as luzes do shopping se apagaram! Por cinco segundos não foi possível ver os logos das lojas, nem ao menos o vendedor que se encontrava do outro lado do balcão. Uma euforia quase inédita tomou conta dos consumidores, e dos vendedores, que num reflexo contra o estado de natureza de Hobbes, correram a fechar suas portas. Ainda não se sabe se para evitar o furto de ladrões em potencial, ou se para segurar os clientes e não perderem a comissão das vendas.
Depois de longos 5 segundos, acenderam-se as luzes de emergência. O shopping ficou feio, sem graça, os enfeites do Natal deixaram de brilhar. Sem a eletricidade viva de todos os dias, aquele que é um dos símbolos do capitalismo se mostrou vulnerável às forças da natureza. O Mc Donald´s parou de funcionar, as sessões de cinema água-com-açúcar hollywoodianas foram interrompidas, e os cartões de crédito, naquele momento, não eram úteis. Era o fim do domingo.
Momento de hesitação. O que seria de nosso Natal sem os pisca-piscas? O que seria da Times Square sem seus outdoors eletrônicos? E Paris, sem suas luzes? O que é o homem moderno sem a energia elétrica?
Pode-se dizer, assim, que o homem não é mais um ser iluminado. Somos dependentes da tecnologia, dependemos de um aparelho que há dez anos não existia – o celular – para nos sentirmos sãos e precavidos; dependemos do computador para pensar; dependemos daquilo tudo que criamos: um mundo artificial. A crise dos aeroportos do Brasil está ilustrando o tema deste artigo: amputou a mobilidade de mulheres, homens de negócios, turistas, e colocou milhares de pessoas em desespero. Enquanto as caravelas de Colombo e Cabral demoraram três, quatro meses para chegar ao “novo mundo”, uma espera por um vôo que ultrapassa quarenta minutos parece levar uma eternidade. No café da manhã, se a torrada leva mais de um minuto para ficar pronta, a boca já não segura os xingamentos. Nos tornamos seres sem paciência.
Nossa luz é artificial. E não só a luz. O Natal, caracterizado por renas, Papai Noel, árvores enfeitadas e luminosas, pisca-piscas, trenós, caixas de presentes com grandes laços, nos foi vendido a preços nada baratos pelas grandes potências do Norte. Pois não temos neve, nosso Natal é tropical. Ao invés de botas, nosso Papai Noel deveria usar nossas Havaianas. Ao invés de pinheiros, por que não um coqueiro altivo e enfeitado? E em substituição das renas, um jegue do sertão nordestino? O que seria uma data de celebração do amor, reencontro, união familiar, tempo de reflexão e perdão, nos aparece em formato de consumo: consumo de lâmpadas coloridas, presentes, cheques-especiais, e dívidas para o próspero ano de 2007.
O comércio foi afetado no trágico domingo de tempestade. E o homem moderno é afetado a cada dia que passa, a cada luz que acende, e a cada luz interior que deixa de acender. Desenvolvemos a tecnologia de ponta, mas deixamos esquecidos em um velho baú valores para o desenvolvimento humano. Numa era onde as crianças esperam do Papai Noel um Play Station 3, ou pelo menos o 2, e não compreendem o verdadeiro significado das luzes do Natal, o mais plausível é concordar com Lévi-Strauss.
A encruzilhada do mundo moderno é: ao se render às engenhocas e ideologias modernas, o homem perde; mas ao se fechar ao sistema, deixa de ganhar. O homem criou a luz elétrica, e apagou a luz humana. E quando as garras da natureza novamente colocarem os consumidores desse “mundo shopping center” no escuro? Aí então, salve-se quem puder...
O insuportável calor de Ribeirão Preto, que já começou a dar dicas de como será o verão, já indicava a possibilidade de um temporal. Este, que chegou repentinamente, escureceu os céus de um domingo que parecia normal. Domingo, quando o maior shopping center da cidade se enche de pessoas que não tiveram tempo de comprar durante a semana, de grupos de amigos que se renderiam às gorduras trans de um Big Mac, ou casais de namorados que curtem um cineminha no final do dia, para começar a semana com o pé direito. Mas então, o céu desabou, e as luzes do shopping se apagaram! Por cinco segundos não foi possível ver os logos das lojas, nem ao menos o vendedor que se encontrava do outro lado do balcão. Uma euforia quase inédita tomou conta dos consumidores, e dos vendedores, que num reflexo contra o estado de natureza de Hobbes, correram a fechar suas portas. Ainda não se sabe se para evitar o furto de ladrões em potencial, ou se para segurar os clientes e não perderem a comissão das vendas.
Depois de longos 5 segundos, acenderam-se as luzes de emergência. O shopping ficou feio, sem graça, os enfeites do Natal deixaram de brilhar. Sem a eletricidade viva de todos os dias, aquele que é um dos símbolos do capitalismo se mostrou vulnerável às forças da natureza. O Mc Donald´s parou de funcionar, as sessões de cinema água-com-açúcar hollywoodianas foram interrompidas, e os cartões de crédito, naquele momento, não eram úteis. Era o fim do domingo.
Momento de hesitação. O que seria de nosso Natal sem os pisca-piscas? O que seria da Times Square sem seus outdoors eletrônicos? E Paris, sem suas luzes? O que é o homem moderno sem a energia elétrica?
Pode-se dizer, assim, que o homem não é mais um ser iluminado. Somos dependentes da tecnologia, dependemos de um aparelho que há dez anos não existia – o celular – para nos sentirmos sãos e precavidos; dependemos do computador para pensar; dependemos daquilo tudo que criamos: um mundo artificial. A crise dos aeroportos do Brasil está ilustrando o tema deste artigo: amputou a mobilidade de mulheres, homens de negócios, turistas, e colocou milhares de pessoas em desespero. Enquanto as caravelas de Colombo e Cabral demoraram três, quatro meses para chegar ao “novo mundo”, uma espera por um vôo que ultrapassa quarenta minutos parece levar uma eternidade. No café da manhã, se a torrada leva mais de um minuto para ficar pronta, a boca já não segura os xingamentos. Nos tornamos seres sem paciência.
Nossa luz é artificial. E não só a luz. O Natal, caracterizado por renas, Papai Noel, árvores enfeitadas e luminosas, pisca-piscas, trenós, caixas de presentes com grandes laços, nos foi vendido a preços nada baratos pelas grandes potências do Norte. Pois não temos neve, nosso Natal é tropical. Ao invés de botas, nosso Papai Noel deveria usar nossas Havaianas. Ao invés de pinheiros, por que não um coqueiro altivo e enfeitado? E em substituição das renas, um jegue do sertão nordestino? O que seria uma data de celebração do amor, reencontro, união familiar, tempo de reflexão e perdão, nos aparece em formato de consumo: consumo de lâmpadas coloridas, presentes, cheques-especiais, e dívidas para o próspero ano de 2007.
O comércio foi afetado no trágico domingo de tempestade. E o homem moderno é afetado a cada dia que passa, a cada luz que acende, e a cada luz interior que deixa de acender. Desenvolvemos a tecnologia de ponta, mas deixamos esquecidos em um velho baú valores para o desenvolvimento humano. Numa era onde as crianças esperam do Papai Noel um Play Station 3, ou pelo menos o 2, e não compreendem o verdadeiro significado das luzes do Natal, o mais plausível é concordar com Lévi-Strauss.
A encruzilhada do mundo moderno é: ao se render às engenhocas e ideologias modernas, o homem perde; mas ao se fechar ao sistema, deixa de ganhar. O homem criou a luz elétrica, e apagou a luz humana. E quando as garras da natureza novamente colocarem os consumidores desse “mundo shopping center” no escuro? Aí então, salve-se quem puder...